terça-feira, 11 de abril de 2017

Da morte ao descaso: cemitérios são negligenciados em Pernambuco

Primeira reportagem da série mostra o risco ambiental nas necrópoles públicas da Capital e a falta de estudos que apontem alcance de eventual contaminação dos lençóis freáticos

Folha de Pernambuco publica até quinta-feira o especial “Da morte ao descaso”, sobre a situação dos cinco cemitérios públicos do Recife. A série trata da contaminação dos lençóis freáticos, da falta de vagas para sepultamentos, do descaso com os mortos e da ausência de uma legislação que regule a exumação de corpos. Em dez dias de apuração, a reportagem foi aos cemitérios de Santo Amaro, Parque das Flores, da Várzea, de Tejipió (Pacheco) e de Casa Amarela. Nesses locais presenciou o que acontece com um espaço público quando ele é negligenciado.
Em 4 de março de 2010, o Ministério Público de Pernambuco (MPPE) converteu em Inquérito Civil um procedimento administrativo iniciado 10 anos antes, com a primeira denúncia contra o cemitério de Santo Amaro que iniciou em 2000 o que hoje é um calhamaço de páginas. Veio de um cidadão recifense que se alarmou com o que viu – um cenário que se vê em todas as cinco necrópoles públicas da Capital: ossos pelo chão, covas abertas, necrochorume* “brotando” de gavetas feitas de materiais porosos (como tijolos, cimento e gesso), sepultamento de corpos em cima de corpos e funcionários trabalhando sem Equipamentos de Proteção Individual (EPIs).
Funcionário sem equipamento de segurança recolhe restos de roupas retirados de túmulos. Ossos ficam expostos nas valas ou jogados no chão
Funcionário sem equipamento de segurança recolhe restos de roupas retirados de túmulos. Ossos ficam expostos nas valas ou jogados no chão

O mundo funerário é um caso tácito de problemas em todo País, onde apenas um cemitério - o Parque São Pedro, em Curitiba (PR) - tem certificação ambiental, a ISO 14001. Não se trata apenas de um caminho do qual ninguém escapa, mas de uma questão perigosa de saúde pública, com riscos que vão desde o ar aos lençóis freáticos. No inquérito 006/2010 no MPPE, apenas sobre Santo Amaro (o maior do Recife, que recebe em torno de 50 sepultamentos por dia), um laudo chama atenção: a análise de um poço do cemitério mostrou que há na água “coliformes e bactérias heterotróficas” (que agem no processo de decomposição, podendo, ou não, causar doenças) e o laudo aponta resultado “insatisfatório”, com a água inapropriada para consumo humano. Na época, a Autarquia de Manutenção e Limpeza Urbana do Recife (Emlurb), responsável pela gestão dos cemitérios públicos da Capital, comunicou ao MPPE que a água era usada apenas para limpeza e irrigação de plantas; a consumida pelos funcionários viria engarrafada.

Outro laudo anexado ao inquérito é o do poço do Pronto Socorro Cardiológico de Pernambuco (Procape), perfurado a 202 metros de profundidade. A água, segundo as análises, está em condições “satisfatórias”, apta para consumo humano, mas um detalhe acende o sinal de alerta: mesmo de poço tão profundo, também apresenta bactérias heterotróficas em pequena quantidade.

“Há claramente um grande risco ambiental. Certamente não é comum que se encontre bactérias nessa profundidade”, alerta o professor da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap) e doutor em Geotecnia Ambiental, Eduardo Maia. A 200 metros, ele diz, o poço alcançou um aquífero confinado que possui proteção de camada argilosa, com baixa permeabilidade. A contaminação pode ter ocorrido tanto pela infiltração de necrochorume, com o decorrer do tempo, quanto no processo de perfuração, mas o fato é que é extremamente provável que tenha sido causada pelo cemitério (o laudo não atesta causa). “Estudos mais amplos poderiam ser realizados para comprovar outras possíveis contaminações”, pondera Maia.

“O próprio necrochorume modifica a capacidade natural de filtração do solo. Tudo é consequência da falta de ordenamento urbano, porque precisaria, inclusive, que os cemitérios estivessem longe de residências e hospitais”, comenta o biólogo e diretor de Projetos do Centro de Pesquisas Ambientais do Nordeste, Severino Ribeiro. Ele diz que a questão é ainda mais preocupante porque, mesmo que os cemitérios sejam desativados a renovação dos solos teriam custos de bioengenharia altíssimos. “De forma alguma aconteceria por um processo natural, com o tempo”.

Ao longo de sete anos desde a instauração do inquérito e 17 da chegada da primeira denúncia documentada, não foram feitas análises que apontem o alcance dessa contaminação, o raio que ela atinge no bairro de Santo Amaro e o que mais ela pode estar comprometendo. O promotor do MPPE, Ricardo Coelho, responsável por questões ligadas ao meio ambiente, diz que pedirá que sejam executados esses estudos na circunvizinhança do cemitério, assim como no hospital Oswaldo Cruz, também vizinho de Santo Amaro. O promotor não descarta a possibilidade de interdição do cemitério, mas pondera que não é uma ação fácil de aplicar: “onde vão enterrar as pessoas?”.

A contaminação não se dá apenas no solo e nos lençóis freáticos, mas também no ar, e isso é mais um agravante tanto para populações circunvizinhas quanto para funcionários das necrópoles. Recentemente, a Emlurb deixou de renovar contrato com a prestadora de serviços de manutenção e limpeza dessas áreas. No lugar, explicou o diretor de Operações Adriano Freitas, efetivou reeducandos do sistema prisional nas tarefas, reforçando o time dos funcionários da própria autarquia, que está há anos em funções como de coveiro e reduzindo os custos com mão de obra pela metade.

São eles as principais vítimas do gás sulfídrico, exalado no processo de decomposição de corpos. Não são apenas as náuseas devidas ao mau cheiro, mas a inalação constante desse gás pode desencadear leucemia (câncer no sangue) quando em exposição constante, segundo Maia. “Quando em contato com o gás sulfídrico, as hemácias, ao invés de aceptar (fixar) o oxigênio, começam a aceptar também o dióxido de enxofre, e o enxofre começa a circular no nosso organismo. A doença é comum a pessoas que trabalham em aterros sanitários, lixões e cemitérios”. Embora a Emlurb afirme que o seu setor de Segurança do Trabalho acompanha de perto o uso de EPIs - “fardamento obrigatório, calçado, luvas e respirador (espécie de máscara)” - a reportagem flagrou funcionários trabalhando sem proteção em todos os cinco cemitérios públicos do Recife em 10 dias de apuração, inclusive fazendo recolhimento de restos de caixão, um material altamente contaminado.

O ex-secretário de Meio Ambiente de Pernambuco, Helvio Polito, que coordenou a criação do Plano Estadual de Resíduos Sólidos disse à reportagem que o documento não dá qualquer orientação para a destinação de resíduos funerários (caixões, ossos, vestes, por exemplo). Pela falta de estudos, não se pode mensurar os danos causados pela convivência com cemitérios, mas o caso do Recife é considerado grave pelos especialistas como o professor de Ecologia da Universidade Federal de Pernambuco e presidente da Associação Águas do Nordeste, Ricardo Braga. “O uso de poços rasos no Recife não é aconselhável, é preciso que o recifense tenha consciência. Temos lençóis freáticos rasos e em bairros como Várzea, Casa Amarela e Santo Amaro, ele pode até aflorar numa chuva intensa”.

Saiba mais:
Necrochorume: líquido originado do processo de decomposição do cadáver, composto por água, sais minerais e substancias orgânicas, responsável pela contaminação do solo e aqüíferos subterrâneos.
Funcionário sem equipamento de segurança recolhe restos de roupas retirados de túmulos. Ossos ficam expostos nas valas ou jogados no chão

Fonte: http://www.folhape.com.br/noticias/noticias/cotidiano/2017/04/11/NWS,23955,70,449,NOTICIAS,2190-DA-MORTE-DESCASO-CEMITERIOS-SAO-NEGLIGENCIADOS-PERNAMBUCO.aspx -   Por: Tatiana Notaro, do Portal FolhaPE em 11/04/17 às 08H00, atualizado em 11/04/17 às 00H08



quinta-feira, 23 de março de 2017

Devedores da Previdência respondem por quase três vezes o déficit do setor


       Os devedores da Previdência Social acumulam uma dívida de R$ 426,07 bilhões, quase três vezes o atual déficit do setor, que foi cerca de R$ 149,7 bilhões no ano passado. Na lista, que tem mais de 500 nomes, aparecem empresas públicas, privadas, fundações, governos estaduais e prefeituras que devem ao Regime Geral da Previdência Social. O levantamento foi feito pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, responsável pela cobrança dessas dívidas.
De acordo com o coordenador-geral da Dívida Ativa da União, Cristiano Lins de Moraes, algumas dessas dívidas começaram na década de 60. “Tem débitos de devedores de vários tipos, desde um pequeno a um grande devedor, e entre eles há muita variação de capacidade econômica e financeira. Também há algumas situações de fraude, crimes de sonegação e esquemas fraudulentos sofisticados. Às vezes, um devedor que aparenta não ter movimentação financeira esconde uma organização que tem poder econômico por trás dele”, afirma o procurador da Fazenda Nacional.
A antiga companhia aérea Varig, que faliu em 2006, lidera a lista com R$ 3,713 bilhões. O levantamento inclui outras instituições que também decretaram falência: Vasp, que encerrou as atividades em 2005 e teve a falência decretada em 2008, com dívida de R$ 1,683 bilhão; o antigo Banco do Ceará (Bancesa), com uma dívida de R$ 1,418 bilhão; e a TV Manchete, que tem débitos no valor de mais de R$ 336 milhões.
Grandes empresas também constam entre os devedores da Previdência, como a mineradora Vale (R$ 275 milhões) e a JBS, da Friboi, com R$ 1,8 bilhão, a segunda maior da lista.
A lista inclui ainda bancos públicos e privados, como a Caixa Econômica Federal (R$ 549 milhões), o Bradesco (R$ 465 milhões), o Banco do Brasil (R$ 208 milhões) e o Itaú Unibanco (R$ 88 milhões).
A Procuradoria-geral da Fazenda Nacional tenta recuperar parte do dinheiro por meio de ações na Justiça. No ano passado, foram recuperados aproximadamente R$ 4,150 bilhões, cerca de 1% do total devido. O valo recuperado foi 11% superior ao de 2015.
Cristiano de Moraes diz que a Procuradoria-Geral da Fazenda nacional tem desenvolvido projetos para agilizar o pagamento das dívidas, mas programas de parcelamento de dívidas de estados e prefeituras atrasam com frequência o pagamento dos débitos.

Saiba Mais


  • Previdência responde por 97% do déficit nas contas públicas em 2016
O defícit da Previdência Social é um dos argumentos do governo para fazer a reforma do setor, que está em análise na Câmara dos Deputados.
Já a Associação Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal e centrais sindicais propõem mudanças na forma de arrecadação e cobrança de débitos previdenciários. “É preciso fazer primeiro ajustes no lado das fontes de financiamento. Ou seja, cobrar essa dívida que é dinheiro sagrado de aposentados e pensionistas e foi ao longo do tempo acumulada, gerando quase de R$ 500 bilhões de débitos inscritos, fora o que está na fase administrativa. O índice de recuperação é pequeno e lento, temos que criar métodos mais ágeis de recuperação desses recursos”, disse Moraes.

Respostas

A Caixa Econômica Federal informou, por meio da assessoria, que paga corretamente e sem atraso todas as contribuições previdenciárias, mas questiona cobranças geradas por processos judiciais movidos por empregados.

Em nota, a JBS diz que já se propôs a pagar as dívidas com créditos que acumula na Receita Federal, mas ressalta que a ineficiência no sistema de cobrança impede que a troca ocorra, o que tem gerado multa, também contestada pela empresa. “A JBS não pode ser penalizada pela demora da Receita Federal em ressarcir seus créditos, mesmo porque se, de um lado, o Fisco não reconhece a correção dos créditos da companhia, de outro, tenta exigir os débitos tardiamente, corrigidos e com multa."

A mineradora Vale, também em nota, diz que, como a maioria das empresas e dos governos municipais e estaduais, tem discussões judiciais sobre temas previdenciários. "Todas as discussões possuem garantia judicial, o que nos permite a obtenção e manutenção do atestado de "Regularidade Fiscal" até o final dos processos (trânsito em julgado). Entendemos que há chances de êxito em todas as nossas discussões."
O Bradesco informou, em nota, que “não comenta questões sob análise administrativa ou judicial dos órgãos responsáveis”.

O Banco do Brasil informou, também por nota, que a dívida é referente a "um processo de tomada de contas especiais promovida pelo TCU, o Tribunal de Contas da União, em 1992, que entendeu serem indevidos os valores auferidos pela rede bancária nos meses de novembro e dezembro de 1991”. O banco recorreu da decisão do TCU na Justiça Federal.

O Itaú não se manifestou até a publicação do texto. A reportagem não conseguiu contato com representantes da Varig, Vasp, Bancesa e TV Manchete.  

Fonte: http://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2017-02/devedores-da-previdencia-devem-quase-tres-vezes-o-deficit-do-setor - Data: 20/02/2017 - 19:07hs

quarta-feira, 15 de março de 2017

BNDES financiará projetos de energia renovável na Amazônia

De acordo com o BNDES, o Amazonas tem atualmente 225 usinas a diesel, que consomem 687 milhões de litros do combustível por ano

Amazônia

Amazônia: o sistema atual emite cerca de 2 milhões de toneladas de dióxido de carbono (foto/Divulgação)


O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) aprovou hoje (14) condições especiais de financiamento para projetos de geração renovável de energia elétrica a serem implementados em áreas isoladas da região amazônica em parceria com a Amazonas Energia, distribuidora de energia elétrica controlada pelo Sistema Eletrobras.
De acordo com o BNDES, o Amazonas tem atualmente 225 usinas a diesel, com capacidade instalada de 683 megawatts (MW) que consomem, por ano, 687 milhões de litros do combustível.
O sistema emite cerca de 2 milhões de toneladas de dióxido de carbono (CO2), outros gases poluentes (NOx e SOx) e particulados, além do risco de poluição dos rios decorrentes de naufrágios ou vazamentos no transporte e armazenamento do combustível.
Com a medida, os itens financiáveis dos projetos – a serem licitados na Segunda Etapa do Leilão 002/2016 da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), agendado pelo Ministério de Minas e Energia (MME) para o dia 11 de maio – poderão usar 15% de recursos do Fundo Nacional de Mudanças do Clima, com taxa anual de 1%.
O financiamento poderá ainda ser complementado em taxa de juros de longo prazo (TJLP), cuja taxa atual é de 7,5% ao ano, até o percentual de 80% previsto nas novas políticas operacionais do BNDES.
Os projetos de energia solar e micro, pequenas e médias empresas que usarem os recursos do Fundo Clima poderão complementar o financiamento com mais 65% em TJLP e as demais fontes renováveis, como eólica e biomassa, em até 55%.
O prazo de carência do financiamento é de até seis meses após a entrada em operação comercial do projeto e o prazo de amortização será inferior, em pelo menos dois anos, ao término do prazo do Contrato de Compra e Venda de Energia.
Segundo o BNDES, o leilão da Aneel já recebeu a inscrição de 36 projetos de energia renovável. O Fundo Clima poderá destinar até R$ 200 milhões para financiar esses empreendimentos, que terão prazo de até 24 meses para utilização dos recursos após a data do leilão. O Contrato de Compra e Venda de Energia terá prazo de até 15 anos.

Fundo Clima

Vinculado ao Ministério do Meio Ambiente, o Fundo Clima é um dos principais instrumentos da Política Nacional sobre Mudança do Clima para apoio financeiro a projetos de redução de emissões de gases de efeito estufa.
As aplicações não reembolsáveis são feitas pelo ministério e as reembolsáveis administradas pelo BNDES, seguindo diretrizes do Comitê Orientador do Fundo Clima, presidido pelo Ministério do Meio Ambiente.
Desde 2011, mais de 190 projetos não reembolsáveis foram contratados pelo Fundo Clima, dos quais 65 foram concluídos, contribuindo para o alcance das metas de assumidas pelo Brasil no Acordo de Paris, em 2015.

Fonte: http://exame.abril.com.br/economia/bndes-financiara-projetos-de-energia-renovavel-na-amazonia/  -  Data 15/03/2017 - 14:26hs